corpo virtual
O texto que se segue é de José Bragança de Miranda, da Universidade Nova de Lisboa; (os sublinhados são meus):
"A cibernética de Wiener, os programas de Turing, a inteligência artificial ...são tudo passos no caminho para a emergência do espaço de controlo. Parecendo confundir-se o virtual e o cyberspace ...é essencial analisá-los separadamente. Seria possível mostrar que a tecnologização do virtual foi preparada pela metafísica, e a teologia ocidental, esse bloco que Heidegger denominava por «onto-teologia ocidental». Neste processo desempenhou papel determinante o esquema aristotélico da dynamis/energeia... Algo que começou por ser teológico e depois político, está a tornar-se hoje tecnológico… Este espaço de realização tinha a sua matriz na oposição entre possibilidade e existência, que se modulava numa série de outras oposições, como as de princípio e fim, de presença/ausência, de hard e de soft, de permanente e de efémero, etc. etc. A dualidade destas séries era absolutamente necessária, mas a verdadeira linguagem binária acabaria por ser a informática... O virtual era o espaço do imaginário... onde se intuíam, ou se construíam as possibilidades. …Esse processo era ambivalente: por um lado, levava à separação entre ideal e material, entre presente e ausente ... por outro lado, virtualmente estes elementos mantinham-se tensionalmente ligados. …Com as tecnologias da informação, a técnica determina a realização dentro de processos de controlo abrangentes. Daí que o virtual emirja explicitamente, confundindo-se agora não com o espaço «real», mas com o espaço de controlo... O cyberspace é um espaço de modulações, ... de linearização absoluta, controlando as regras mais que as posições. Bom exemplo disso é o hypertext. … Para se transformar o espaço virtual em algo controlável este tem de ser linearizável… Depois é preciso um controlo desse controlo, e portanto uma linearização de segundo nível e por aí fora, numa circularidade que ocorre fora do tempo, a que paradoxalmente se chama «tempo-real». Como mostra William Burroughs é um tempo da morte infinitamente suspenso sobre o espaçamento do controlo. …Dada a radicalidade deste controlo do controlo que é o cyberspace parece irrisória a tentativa da Realpolitik que procura servir-se do controlo para sobreviver… Enquanto cyberspace tudo se joga na actualização de certas possibilidades, provenientes do arquivo geral da experiência que é a cultura. Só que essa actualização é puramente simulacral, pois se tudo se pode actualizar é porque é indiferente aquilo que é actualizável. O virtual pode servir assim de espaço de suporte para a inscrição imediata do mundo e dos corpos no controlo. No fundo tudo depende de se conseguir distinguir a virtualidade da potencialidade. Será que se deve ao facto da existência, da efectividade?… Que levava já McLuhan a dizer em 1969 que «A atracção pelas drogas alucinogéneas é um meio de alcançar a empatia com o nosso meio ambiente electrónico, ambiente esse que é em si uma viagem interior sem drogas» …O complicado aparato de luvas e de eléctrodos que hoje simulam a «realidade virtual» exige justamente formas de apagamento da realidade «real» do metal e das próteses para se poder atingir o estado alucinatório. ...Ou enxertando-se directamente no cérebro, simples electrotropismos. O imaginário do zaping dissemina-se, tudo se resumindo a uma controlo remoto, mas não menos efectivo de uma «montage of attractions»" (Sergei Eisenstein)."
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