30 abril 2005

corpo em Peter Greenaway

corpo em Peter Greenaway

Posted by Hello
Peter Greenaway é um dos realizadores que mais explora o tema dos rituais com os quais a sociedade ocidental oculta o corpo. Ele usa o nu na sua forma barroca, fútil e excessiva. De toda a sua extensa filmografia, O cozinheiro, o ladrão, a sua mulher e o amante e o Livro de Cabeceira são aqueles em que, mais claramente, o corpo é associado ao consumismo, metáfora do capitalismo crescente; no primeiro associado ao canibalismo (metáfora do consumismo levado ao extremo), no segundo, o corpo apresentado como imagem de uma literacia abandonada pela cultura moderna, o corpo que perde a sua capacidade significativa, escondido por debaixo da capa das letras, que o abafam e reprimem. A cultura como bem consumível é uma das metáforas mais usadas nos filmes de Greenaway.
A imagem dos corpos em Peter Greenaway fazem parte de uma imagética revolucionadora no cinema. Greenaway pinta, mais do que realiza, os planos dos seus filmes (revelando aliás a sua primeira formação que foi a pintura). Por via do excesso organizam-se em série vários de seus filmes. Em Drawing by Numbers há uma numeração de um a cem, que vai do início ao fim do filme. Em The Prospero’s Books são os livros que determinam a ordem dos acontecimentos. Os filmes de Greenaway convidam à sedução visual assim como ao desafio intelectual. Como puzzles intrigantes, obrigam o espectador, através de pistas e vestígios, à investigação. Elemento chave para a compreensão de cada filme, o corpo ocupa um lugar de destaque na obra de Greenaway, tendo um significado próprio: o corpo nu é sereno, o corpo vestido está pesado da culpa e da vergonha. Para Greenwawy o uso excessivo do corpo acaba no canibalismo, metaforicamente e literalmente em vários dos seus filmes. Alusão à moral excessiva, proveniente da tradição cristã em que na Ceia Final, Cristo oferece o Seu Corpo, numa simbiose total do corpo material “este é o meu corpo”. O consumismo capitalista e o cristianismo têm a mesma metáfora do consumo do físico, através do corpo. O centro de todas as questões que atravessa todos os tempos, todas as culturas e identidades é o próprio eu físico. Todos têm um corpo, mutilado ou não, todos os seres têm na sua exterioridade uma forma de filtrar a imagem interior. As interpretações sobre o corpo variam, os rituais do corpo mudam, mas o corpo continua, imune às concepções filosóficas. Nas sociedades consumistas e hedonistas, o culto ao corpo é muito intenso, num sentido comercial. O corpo dos filmes de Greenaway ignora as modas, o corpo não é jovem, elegante; por vezes é mesmo “aparentemente feio”, escapando aos estereótipos criados pelas modas: este parece-me ser o aspecto mais importante evidenciado por Greenaway; quando representa o corpo, são as várias vertentes do uso omnipresente do corpo, o interior, o exterior, o doente e o são, a deformação … É toda uma enciclopédia fisiológica da humanidade.

28 abril 2005

"Cantando por detrás das Cortinas" Posted by Hello
Posted by Hello "Cantando por detrás das Cortinas" é o mais recente filme de Ermano Olmi. Com Bud Spencer e Jun Ichikawa, “Cantando por detrás das Cortinas” estreou hoje, apresentando-se como um dos mais belos filmes de sempre.
Adaptação de um conto chinês do séc. XIX, o enredo gira à volta de piratas e corsários nos mares do Oriente.
Numa casa de má reputação, bordel oriental dirigido a clientela ocidental sedenta do exotismo sensual do oriente, é contada uma lenda de uma mulher pirata, apaixonada e sensual: a história de Ching, viúva do Almirante Ching, passa-se entre pilhagens e piratarias, juntamente com poesia e fábula. “Cantando por detrás das Cortinas” mistura teatro aventuras, exotismo e sensualidade. Fantástico e poético, este filme é de uma beleza sublime.

24 abril 2005

Link Cyborg Manifesto

Cyborg Manifesto


Cyborg Posted by Hello

"A cyborg is a cybernetic organism, a hybrid of machine and organism, a creature of social reality as well as a creature of fiction... Modern medicine is also full of cyborgs... Cyborg 'sex' restores some of the lovely replicative baroque of ferns and invertebrates (such nice organic prophylactics against heterosexism). Cyborg replication is uncoupled from organic reproduction... The replicant Rachel in the Ridley Scott film Blade Runner stands as the image of a cyborg culture's fear, love, and confusion..." Cyborg Manifesto escrito por Donna Haraway

Link corpos

corpos

"A tese de Haraway é que somos todos ciborgs e que a cibercultura tem por mérito dissolver os dualismos que pautaram até o momento o modo de pensar ocidental, como a oposição entre espírito e matéria, porque transgride a fronteira que separava o natural do artificial, permitindo pensar em um tempo pós-sexuado." O ensaio é muito bom, chama-se Corpos solúveis e foi escrito por Giselle Beiguelman, professora do curso de pós-graduação em Comunicação e Semiótica; pode lê-lo aqui.

realidade

realidade

As novas tecnologias reformulam a noção de corpo, matéria, espaço e tempo. No ciberespaço, espaço não-linear,podemos criar identidades, eliminando conceitos tão primários como o de género, por exemplo (nos chats, cada um pode construir-se, adoptando o tipo de personalidade que desejar, o sexo que preferir, ou seja, inventando a sua identidade). Assim, a definição do corpo é desnecessária, importando apenas a identidade criada através da máquina (no caso o computador pessoal ligado ao super-computador que o conecta aos outros através das hiper-redes). O corpo e a máquina integram-se em simbiose no espaço virtual. Até que ponto é que o ser que conhecemos no chat é "real"? Coloco-me a pergunta sobre a identidade de um corpo ligado a uma máquina hospitalar. Retirados os tubos, os ventiladores, soros, alimentação artificial que se interlaçam, frios, unidos ao computador, o ser humano morre. Nessa simbiose corpo/máquina onde está a identidade? Onde está a consciência, a vida? No corpo ou na máquina? A minha resposta é que essa vida não está em nenhum dos dois elementos, porque a transcende. A identidade do ser humano reside nessa transcendência limitada pelo corpo; quando este entra num estado de vida apenas suportado pelas novas tecnologias, essa transcendência (uns chamam-lhe alma, outros espírito ou consciência) mostra-se em pequenos vislumbres manifestados por um esgar da boca, um leve apertar dos dedos, uma lágrima que corre dos olhos. Mas na maior parte do tempo, essa identidade não está ali, encontra-se num outro espaço, num espaço virtual que não se deixa controlar por nenhuma máquina. Num espaço de liberdade e de felicidade. De luz.

corpo virtual

corpo virtual

O texto que se segue é de José Bragança de Miranda, da Universidade Nova de Lisboa; (os sublinhados são meus):
"A cibernética de Wiener, os programas de Turing, a inteligência artificial ...são tudo passos no caminho para a emergência do espaço de controlo. Parecendo confundir-se o virtual e o cyberspace ...é essencial analisá-los separadamente. Seria possível mostrar que a tecnologização do virtual foi preparada pela metafísica, e a teologia ocidental, esse bloco que Heidegger denominava por «onto-teologia ocidental». Neste processo desempenhou papel determinante o esquema aristotélico da dynamis/energeia... Algo que começou por ser teológico e depois político, está a tornar-se hoje tecnológico… Este espaço de realização tinha a sua matriz na oposição entre possibilidade e existência, que se modulava numa série de outras oposições, como as de princípio e fim, de presença/ausência, de hard e de soft, de permanente e de efémero, etc. etc. A dualidade destas séries era absolutamente necessária, mas a verdadeira linguagem binária acabaria por ser a informática... O virtual era o espaço do imaginário... onde se intuíam, ou se construíam as possibilidades. …Esse processo era ambivalente: por um lado, levava à separação entre ideal e material, entre presente e ausente ... por outro lado, virtualmente estes elementos mantinham-se tensionalmente ligados. …Com as tecnologias da informação, a técnica determina a realização dentro de processos de controlo abrangentes. Daí que o virtual emirja explicitamente, confundindo-se agora não com o espaço «real», mas com o espaço de controlo... O cyberspace é um espaço de modulações, ... de linearização absoluta, controlando as regras mais que as posições. Bom exemplo disso é o hypertext. … Para se transformar o espaço virtual em algo controlável este tem de ser linearizável… Depois é preciso um controlo desse controlo, e portanto uma linearização de segundo nível e por aí fora, numa circularidade que ocorre fora do tempo, a que paradoxalmente se chama «tempo-real». Como mostra William Burroughs é um tempo da morte infinitamente suspenso sobre o espaçamento do controlo. …Dada a radicalidade deste controlo do controlo que é o cyberspace parece irrisória a tentativa da Realpolitik que procura servir-se do controlo para sobreviver… Enquanto cyberspace tudo se joga na actualização de certas possibilidades, provenientes do arquivo geral da experiência que é a cultura. Só que essa actualização é puramente simulacral, pois se tudo se pode actualizar é porque é indiferente aquilo que é actualizável. O virtual pode servir assim de espaço de suporte para a inscrição imediata do mundo e dos corpos no controlo. No fundo tudo depende de se conseguir distinguir a virtualidade da potencialidade. Será que se deve ao facto da existência, da efectividade?… Que levava já McLuhan a dizer em 1969 que «A atracção pelas drogas alucinogéneas é um meio de alcançar a empatia com o nosso meio ambiente electrónico, ambiente esse que é em si uma viagem interior sem drogas» …O complicado aparato de luvas e de eléctrodos que hoje simulam a «realidade virtual» exige justamente formas de apagamento da realidade «real» do metal e das próteses para se poder atingir o estado alucinatório. ...Ou enxertando-se directamente no cérebro, simples electrotropismos. O imaginário do zaping dissemina-se, tudo se resumindo a uma controlo remoto, mas não menos efectivo de uma «montage of attractions»" (Sergei Eisenstein)."


 Posted by Hello

Link Bem Vindo

Bem Vindo

Este blog serve como uma forma de ordenar ideias, fazer uma recolha de textos e interpretar livros, teses, ensaios e outras leituras que me servirão de base para a realização da tese de investigação que estou a realizar na área da Comunicação e Cinema. Como o nome indica, "cinecultura" é a área onde gostaria de trabalhar. O corpo é a área que e fascina (na Cultura, em geral, e Antropologia); tema cada vez mais frequente no cinema, pode-se dizer que a simbiose entre o corpo humano e a máquina começa em Vertov n' O Homem e a Câmara, ao usar a máquina de filmar como prótese do seu olhar crítico perante a modernidade de um novo urbanismo, mas é no final do séc. XX, com a ascensão das novas tecnologias, que realizadores como David Lynch e Cronenberg exploram esta simbiose.Espero que todos me ajudem com sugestões, críticas e orientação objectiva e dura.Vou tentar realizar posts sugestivos e criativos.